Lições em tempos de Pandemia: Quinta lição Desapego
Somos seres sociais, temos necessidade de nos relacionar, de receber atenção, carinho, bem como poder cuidar e amar o outro, no entanto, se somos seres afetivos porque nos desesperamos tanto com perdas materiais? Talvez seja porque desde muito pequenos presenciamos os adultos se dedicarem em demasia para obter bens materiais, talvez porque pensávamos que isso é ser feliz, ou que isso nos garantiria afeto e atenção.
Há uma outra explicação científica para o apego material dos seres humanos que faz sentido. Enquanto raça humana desenvolvemos aprendizados de como sermos humanos, de como falarmos, agirmos devido aos nossos neurônios espelhos, uma classe de neurônios identificados no final da década 1990 em experimentos realizado com macacos, no entanto, foi possível descobrir essa categoria de neurônios no ser humano. Por exemplo, quando a pessoa apenas observa a execução de uma ação, como por exemplo ser agressivo com um animal, ou perceber que o adulto oferece mais atenção ao trabalho do que aos filhos, o observador tem as mesmas regiões cerebrais ativadas apenas pelo ato de presenciar tal realidade.
Desta forma é possível compreender por que ao longo da vida vamos percebendo as repetições de comportamentos dos nossos pais, mesmo quando não aprovávamos suas atitudes e dizíamos nunca farei dessa forma. Então, penso que o apego faz parte de um aprendizado que não precisa ser ensinado por palavras, mas foi aprendido por atitudes que fomos sendo expostos. E, neste momento de perdas econômicas testemunhamos o desespero das pessoas, mesmo diante do risco da sua vida e das pessoas que ama, o foco está nos bens materiais, no quanto está deixando de ganhar. Interessante que os mais revoltados não são aqueles que tem que menos posses, e que teriam razões para se revoltar, pois sua subsistência está ameaçada. A revolta e o negacionismo vem daqueles que com certeza não passarão fome, mas que deixarão de acumular mais riquezas.
Não se trata de julgar, mas de compreender o sofrimento de cada um e de oferecer a possibilidade de análise que promova mudanças mais construtivas. Buscando uma analogia para auxiliar numa reflexão que possa promover mais consciência, ou seja, é como que estivéssemos em uma guerra, neste caso nossa guerra é com um vírus, podíamos pensar que nossas perdas serão certamente menores do que se fosse uma guerra entre nações, pois não há bombas destruindo nossas cidades, nossos hospitais, nossas empresas. O bem material, as máquinas, os prédios estarão lá ao final desta Pandemia, então estamos numa situação muito melhor do que nossos antepassados que tiveram que lidar com a perda de entes queridos e com toda destruição. O luto e a destruição de lares, escolas, hospitais, empresas, enfim a ruína e a dor.
Muitos com que conversei e até mesmo numa reflexão pessoal diante do isolamento social percebemos que precisamos de menos para viver do que julgávamos. Tivemos que perceber que é possível nos recriarmos de uma forma menos consumista. E, como seria nos desapegarmos de bens materiais, de lucros, de acúmulos para ajudar as pessoas que mais necessitam?
E, como seria se dar conta que mesmo com as perdas econômicas que todos certamente teremos poderemos num futuro, esperamos que não muito distante, olhar e tocar quem amamos? Talvez seja uma oportunidade para todos revermos nossas prioridades. Que a prioridade seja preservar a vida e o sentimento de humanidade, ou seja, olhar para o outro com empatia. Sim, precisamos consumir, mas não é essa a prioridade neste momento.
Geralmente o apego vem aliado a inveja, aquele sentimento que causa angústia em quem sente e machuca quem é o alvo, não é um sentimento construtivo, logo não tem uma vibração de amor para o outro, nem mesmo palavras, ou atitudes, muitas vezes a expressão vem por meio da falsidade e do que se chama de “bajulação”. Querer, desejar e sentir raiva pelo o que o outro tem é apego. Buscar trabalhar em nós o desapego é buscar uma liberdade de não depender de posses e acúmulos, é um caminhos para conquistar um sensação de paz. Talvez demore para realizar aquela viagem, ou trocar de carro, ou mudar de casa, mas sua atitude adequada e coerente salvou a vida das pessoas que ama e talvez de tantos que nem consegue imaginar.
Desapegue daquilo que não irá lhe trazer um sentimento de paz, de dignidade e pense estamos todos juntos, iremos perder ou deixar de ganhar em alguma medida, mas se fizermos o nosso melhor para a coletividade teremos a paz de saber que não lutamos nessa guerra como aliado do nosso inimigo, esse vírus.
Que possamos nos reinventar, ou quem sabe nos reencontrar com aquilo que sempre deveria ter sido a prioridade, a vida, o cuidado e generosidade entre nós humanos. Um último pedido, não caia no erro de olhar para o outro quando ler esse texto, na ganância, no egoísmo e mesquinhez do outro, olhe para si, busque carinhosamente avaliar os seus apegos, e se coloque no lugar do outro. Não julgue sinta como seria se você tivesse que arriscar sua vida, como seria perceber que não seguiu as orientações cientificas e de repente perdeu quem mais amava. Poderá até retornar para sua casa confortável, poderá voltar a ter lucros, poderá acumular bens, mas nada poderá reverter esse vazio.
Desapegue de tudo que te afasta do amor, do cuidado e se apegue com toda sua força em ser parte de todos aqueles que buscar fazer algo para contribuir neste momento. Vai passar, mas levaremos conosco as memórias de como lidamos com esse momento, que cada um de nós possa ter um arquivo repleto de memórias de superação, de cooperação, de generosidade e ética, que essa Pandemia em toda a dor que traz, não consiga impedir a sua evolução, que seja aquele abalo que o fez acordar para o que realmente importa, a vida humana, o fazer o bem, ser o bem para si e para o mundo.
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